Quando se olha esta casa, seja ao vivo ou pelas fotografias, não podemos deixar de reparar numa imensa influência feminina – é, sem dúvida, uma ‘casa-mulher’! Com um sorriso fácil, fiel às suas amigas e irremediavelmente romântica, chorando sempre nas mesmas cenas do filme favorito. É este o perfil da cliente de Giano Gonçalves: “Uma mulher muito extrovertida”, que lhe deu “liberdade total”. O arquitecto e decorador madeirense, fundador da loja Ana d’Arfet, no Funchal, tem no seu currículo vários prémios internacionais, figurando pela terceira vez no Andrew Martin Interior Design Review, uma das publicações mais importantes no mundo do design de interiores. E este seria um desafio para qualquer profissional.
A ideia de refúgio no topo das Amoreiras, um ‘jardim suspenso’ alheio à confusão da cidade lá em baixo, levou o decorador a concentrar a sua intervenção em três eixos: antiguidades, obras de arte (na maioria da cliente) e mobiliário taylor made. À primeira vista, a coexistência entre peças de antiquário autênticas e obras de arte de autores consagrados poderia assoberbar o espaço. O equilíbrio entre ambas foi dado com objetos simples de cores claras, da autoria do decorador, criando-se um enquadramento contemporâneo e divertido, longe de uma sensação pesada de ‘decadence’. Por outro lado, os quadros iriam ser os protagonistas da cor, reflexo da personalidade da proprietária, leve, espontânea e divertida.
Gizada a abordagem, foquemo-nos nas peças. Conjugar diversos períodos da história do mobiliário não é uma tarefa óbvia. Seria preciso misturar um par de cadeirões com braços venezianos de finais do século XVII com castiçais e porta livros Art Déco; ou orquestrar peças de várias origens do século XVIII numa melodia coesa. Tornou-se imprescindível estabelecer um paradigma. Requinte, feminilidade, leveza e século XVIII – Marie Antoinette! O filme de Sofia Coppola, adaptado da biografia de Lady Antonia Fraser, conta a história da famosa princesa austríaca que se torna na rainha de França e deixa a sua marca, de fausto e irreverência, na corte de Versailles. Semelhanças com a cliente? Mera coincidência… Mas num instante tinha-se encontrado um arquétipo, obviamente temperado com uma dose q.b. de contemporaneidade. Mas quando se tem em casa peças e objetos como estes, a fantasia pode mesmo falar mais alto. O glamour é intemporal e também transversal: da corte de Versailles à época de ouro de Hollywood (imortalizada pelos painéis de Elizabeth Taylor, assinados por Vik Muniz), das arcas espelhadas Andrew Martin na suíte até aos castiçais italianos do século XIX no lavabo social, sem esquecer os anjos austríacos do século XVIII que ‘guardam’ a lareira, todos estes tesouros ganham uma aura quase mágica, reservada apenas àquelas peças que atravessaram séculos e que conservaram a pátina do tempo até aos nossos dias. Quando se perguntou a Giano Gonçalves que área da casa elegeria de imediato, foi unânime com a sua cliente: a sala, por refletir quem lá vive. E pelo olhar mágico de Elizabeth Taylor, no auge da vida.