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A escola é um sítio onde estão um conjunto de crianças vigiadas por adultos para poderem estar a salvo do mundo exterior enquanto os pais trabalham. Isto acham os pais. Os pais com fraca memória, claro. Porque muitas vezes a escola não é nada disso. É uma selva, onde os miúdos fazem as suas próprias leis de grupo e onde a regra é só uma: integração ou morte. Enfim, morte metafórica, mas mesmo assim uma forma de morte.

Primeira lei da selva: Há que ser o mais igual aos outros. Por isso é que se entrarmos em qualquer escola do País eles estão todos vestidos da mesma maneira. Isto é fácil de entender: corresponde à sensação de grupo, mas também à teoria que diz que, se se der nas vistas no meio da savana, em vez de se ser confundido com as pedras ou as ervas a pessoa torna-se mais visível para os leões. Na escola é a mesma coisa: quem é mais visível, seja por que motivo for, arrisca-se a ser devorado.

Problema: O que é que acontece quando não se é igual ao resto da alcateia? O que é que acontece quando, por algum motivo, se é diferente? Geralmente é-se perseguido. A perseguição pode tomar várias formas: violência física, insultos, ameaças, intimidações, roubos, exclusão do grupo. Há quem saiba dar a volta às suas diferenças e quem fique imediatamente na mira dos perseguidores.

Qual é a diferença? Regra geral, o medo. Os agressores percebem imediatamente quem tem estofo de vítima. Um dos objectivos de se perseguir alguém é precisamente reforçar a coesão de um grupo. Algumas crianças (ou menos crianças.) são tão inseguras que podem reagir de duas maneiras: as agressivas reagem para fora e podem procurar uma vítima; as tímidas reagem para dentro e tornam–se ‘perseguíveis’.

Portanto, basicamente, agressor e agredido são feitos do mesmo material. Claro que isto sabemos nós agora: quem lá está só sabe que há gente neste mundo cuja única missão é fazer-nos a vida num inferno.

A diferença não faz a vítima: Há situações em que uma criança ou um jovem fica fragilizado por ser diferente. Claro que há infinitas maneiras de se ser ‘diferente’. Pode-se ser muito mais baixo, muito mais alto, muito gordo ou muito magro. Pode ser-se discriminado porque se é disléxico, ou celíaco, ou esperto (esta é a idade em que ser esperto equivale a ter uma doença de pele). Pode ser-se excluído porque se usa umas calças feias, porque se veste à ‘beto’ numa escola de freaks ou à freak numa escola de ‘betos’, ou porque não se usa umas calças giras, ou porque se usa meias às riscas, ou porque vem de minis-saia para a escola, ou porque o pai é gordo, a mãe é pobre, a avó lhe chama ‘amorzinho’ à saída, o cão só tem um olho e o avô cospe no chão.
Qualquer coisa serve. Curio-samente, no entanto, segundo vá- rios estudos feitos sobre o assunto, nada disto, por si só, faz de uma criança uma vítima.

Geralmente, quem é perseguido não percebe porque é que isso lhe acontece a ele e não aos outros . Quase sempre aponta a razão errada: pensa que é por ser gordo/alto/celíaco/esperto. Mas a verdadeira razão porque uns são perseguidos e outros não tem mais a ver com atitude do que com diferença. Os agressores perseguem os encolhidos porque não lhes interessa perseguir quem não tem medo deles, interessa-lhes perseguir as vítimas.

As vítimas até podem perceber isto, mas serem capazes de reverter o processo exige um esforço monumental. Para já porque na maioria dos casos, quando os adultos se dão conta disso, o processo já vai avançado. Nenhuma criança vai ter com a mãe e diz: ‘Olha, sabes, uns colegas lá na escola andam a fazer-me a vida num inferno só porque tenho as calças curtas.’ Primeiro porque ninguém gosta de se sentir vítima. Acham que ‘não se faz queixinhas’. E depois porque muitas vezes têm medo de entristecer os pais…

Não mostrar medo: Se não tem a certeza do que está a acontecer, não lhe pergunte directamente: ‘Ouve lá, passa-se alguma coisa na escola?’ O mais certo é receber um sinal de cabeça e uns olhos no chão como res-posta. Pode tentar aquela conversa à noite, quando as almas estão mais frágeis.

Medidas a tomar: Em primeiro lugar, assegure-lhe de que fez bem em contar e que não foi ‘queixinhas’. ‘Queixinhas’ é querer meter os outros em trabalhos, mas quando qualquer coisa de errado se passa deve-se sempre dizer a um adulto.

Dizer ‘Não ligues’ é o pior que se pode fazer. Pois, para nós é muito fácil não ligar, mas é ele que vai para o inferno todos os dias. Nunca diga: ‘Deixa lá, isso passa’ ou ‘Quando isso acontecer, vira-lhes as costas.’ Ele provavelmente já experimentou as duas coisas e nada funcionou.

Claro que a primeira lei é: ‘Acima de tudo, não mostres medo.’ Com certas crianças isso pode requerer um transplante de personalidade que elas não são capazes de fazer. Portanto, tente perceber o que se passa. Explique-lhe que a culpa não é dele, que há pessoas que precisam de fazer mal aos outros para se sentirem seguras.

Conselhos básicos são: tentar estar sempre à vista de um adulto, tentar fazer outros amigos para nunca andar sozinho e sobretudo não responder com violência. Há alturas em que isto é mesmo preciso em defesa própria, mas geralmente o que acontece é: o perseguidor insulta, a vítima perde a cabeça e vai-se a ele, chega um adulto que os separa e castiga a vítima porque ‘foi ele quem começou’.
Mas o mais efectivo é treinar a atitude: observe a maneira como ele anda. Tímido? Ensine-o a rir. Envergonhado? Treine-o a falar alto.

Claro que estas coisas não se mudam de um dia para o outro. Não é de domingo para segunda-feira que se transforma um tímido num extrovertido, e pode ser preciso reforço, uma mudança de visual, por exemplo. Sim, pode pas-sar por umas calças novas. E, sobretudo, dose tripla de auto-estima. Recorde-lhe as coisas em que ele é bom. E pode ainda treinar com ele qualquer coisa para dizer. A expressão ‘E então?’ tem a vantagem de ser aplicável a várias situações: ‘És um ganda beto’ , ‘Sim, sou, e então?’ Lembre-lhe que fazer amigos dá trabalho e também tem de partir de nós. A maioria dos miúdos que não tem muitos amigos não é porque seja, por exemplo, muito esperto. Tristemente, muitos adolescen-tes, não querendo ser burros, também não estão por aí além interessados em ser espertos. Estão é interessados em ser iguais ao resto da ‘matilha’. Portanto, dê–lhe algumas dicas para se aproximar dos outros. Treine com ele em casa, se for preciso. Ele pode, por exemplo, oferecer-se para ajudar os outros nos trabalhos de casa. E pode sugerir-lhe que convide um ou outro menino para vir estudar com ele depois da escola.


Explique-lhe que não ser igual não quer dizer ser pior nem melhor. Às vezes quer dizer apenas que os outros são pouco espertos para perceberem isso. Mas como ele tem de os aturar até ao final do campeonato, desculpem, até porque vale sempre a pena fazer um esforço para descobrir pessoas que possam ser simpáticas.

Factos sobre ‘OS MAUS’

Os rapazes perseguem de forma mais física, com agressões e roubos; as raparigas de forma mais subtil, como os segredinhos e as exclusões do grupo.
Em escolas com melhor vigilância de recreios, estes problemas diminuem muito.
Os alunos ‘não-perseguidores’ defendem as vítimas mais vezes do que os adultos. Quando algum aluno intervém, a perseguição pára em apenas 10 segundos. Mas 85% dos alunos que assistem não fazem nada.
As perseguições acontecem frequentemente longe dos olhares dos adultos. Os adultos intervêm apenas em 4% das situações de perseguição.

GUIA antivítima

– Passe tempo de qualidade com ele. Faça-o sentir que merece que as pessoas gostem dele.

– Inscreva-o num hooby extra-escolar em que ele seja bom e onde possa fazer amigos novos.

– Ele pode ter dificuldade em falar alto:treine com ele, se for preciso.

– Crianças felizes são crianças simpáticas, e é mais difícil que as crianças simpáticas se tornem vítimas.

– Descubra o que é que o torna infeliz para lá do recreio.

– Não o torne ainda mais vítima: ele é disléxico e não consegue ler bem? Pois, mas a Mariana, por exemplo, não sabe a tabuada dos nove… Chamam-lhe ‘Torre Eiffel’? Ela que se ria e lhes chame ‘anõezinhos da Branca de Neve’.Tem um apelido esquisito? É da maneira que as pessoas se lembram sempre dele.

– Mostre-lhe que há mais gente igual a ele: há milhares de outros meninos que também são disléxicos ou não podem comcer cereias…

– Pode ser difícil encaixar na cabeça de alguém que vive no presente, mas diga-lhe que a escola não irá durar sempre e que a vida não é aquilo.

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