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D.R./ André Leonardo

André já nasceu com bicho-carpinteiro e vontade de fazer as coisas acontecerem sem ter que esperar por ninguém, talvez “por culpa dos pais”, diz-nos ao telefone, da ilha Terceira, onde nasceu e continua a viver. Aos seis anos arrancou as flores todas do quintal da mãe para fazer ramos e vender aos vizinhos. Queria dinheiro para comprar duas caixas grandes de pastilhas com recheio, novidade acabada de estrear no continente e que chegaria semanas mais tarde aos Açores. “Pequenino, lourinho de olhos azuis, os vizinhos acharam piada ao rapazinho a vender flores.” O pior foi quando a mãe chegou a casa e viu o lindo serviço…
Um ano ou dois mais tarde, foram os queijos caseiros da tia-avó que fizeram sucesso num almoço de família. Tomou logo ali a iniciativa de montar um negócio. “Pedi à minha tia para começar a fazer queijos, disse que era o representante dela e comecei a anotar listas de clientes e prazos de entrega. Ela achou piada e acabou por me oferecer o dinheiro das vendas. O dinheiro era absolutamente secundário! Fazia-o porque era divertido. Só mais tarde, na faculdade, é que percebi que esta vontade de fazer acontecer tinha um nome: empreendedorismo.”

Correr mundo para lutar contra o desânimo
Entretanto, tirou um mestrado em Gestão no ISCTE, tornou-se consultor e, ainda estudante, organizou duas conferências de empreendedorismo na ilha Terceira. “Foram um sucesso, com mais de 1200 pessoas. A ilha parou!”, conta, orgulhoso. No final de 2011 meteu na cabeça que ia dar a volta ao mundo. Mas não ia para fazer turismo. “Foi na fase em que só se falava de problemas, crise, FMI, Troika; as pessoas estavam desmotivadas, descrentes, fartas de análises macroeconómicas que, bem espremidas, não se traduzem em nada de concreto. Então pensei ‘e se eu desse a volta ao mundo, passando por lugares como Silicon Valley (provavelmente o melhor ecossistema empreendedor do mundo) e por países como o Quénia, a Tanzânia, a Índia, possivelmente com condições mais duras mas onde há pessoas que, todos os dias, fazem as coisas acontecer?’ Queria relatar estas histórias e com elas inspirar as pessoas cá a irem à luta pelos seus objetivos, a fazerem mais.” Dez meses depois de regressar a Portugal, depois de um ano inteiro a correr mundo, lançou o livro ‘Faz Acontecer’ (Esfera do Livros), onde narra as suas aventuras e as lições que aprendeu com dezenas de pessoas tão ou mais empreendedoras que ele, escrito de forma despretensiosa, vivida e contagiante.
A começar pelo seu projeto, podemos tirar lições valiosas para acreditarmos e concretizarmos os nossos sonhos.

1 Trace um plano e reúna recursos (leve o tempo que for preciso)
“Não era uma volta ao mundo para conhecer empreendedores: foi um projeto de inspiração que, por acaso, incluía uma volta ao mundo”, diz André. “Não tinha dinheiro, não conhecia muitos empreendedores do mundo e nunca tinha feito nada do género. Foi um trabalho de pesquisa muito grande, dois anos a procurar empreendedores e associações de empreendedorismo pelo mundo fora, a falar com líderes de opinião.”
Para começar a reunir financiamento, decidiu vender tudo o que tinha. “Não é que fosse grande coisa: a Playstation, coleções de livros dos ‘Cinco’, do Dan Brown, uma camisola assinada pelo Zahovic do Benfica… Depois, fui à procura de patrocinadores – falei com 97 empresas e consegui 7 patrocinadores. Fiz uma campanha de crowdfunding para recolher donativos.”

2 Faça do ‘não’ uma força, não uma derrota
André bateu a muitas portas, mas em vez de se desmotivar com as negas que levou fez delas uma lição para melhorar a sua estratégia. “Ouvi muitos nãos quando fui à procura de patrocínio. A cada um que ouvia, ia adaptando um bocadinho o meu plano. Ao fim de dois anos e quando parti para a viagem ainda me faltava 30% do orçamento. Muita gente me disse para desistir porque não tinha folgas em termos de dinheiro e avisaram-me que tudo o que pudesse correr mal iria correr. Mas eu sou teimoso e fui mesmo.” Quem investiu nele não se arrependeu. O retorno em termos de exposição mediática “ultrapassou todas as expectativas”, porque acabou por dar entrevistas em todo o mundo a propósito do seu projeto.

3 Adapte-se! Não espere pelas condições ideais
Para cortar custos, depois do financiamento reunido, André percebeu que tinha que modificar os seus planos iniciais. “Alterei os meus voos – de voos diretos passei a fazer escalas, mais cansativas mas muito mais baratas –, em vez de ficar em hotéis de duas estrelas ou residenciais, fiquei em casa de pessoas, procurei grupos de couchsurfing no Facebook, até encontrar quem me pudesse receber em todo o mundo. Não comia fora – um dia comia atum com massa, no outro atum com pão, no seguinte atum com… atum. Disseram-me que se havia coisa de que não podia abdicar, era de um saco cama fofo, quente, compacto. Custava entre 400 e 500 euros. Fui com um que me custou €9,99, comprado num supermercado aqui nos Açores. Era dor certa de costas e tinha que dormir vestido, se estivesse frio. Mas entre não o ter e fazer a volta ao mundo e esperar mais uns meses até ele aparecer, preferi seguir viagem logo.”
No mundo dos negócios acontece o mesmo, reflete. “Às vezes andamos com projetos na gaveta, achamos que precisamos de milhões em investimento e por vezes não: é pegar no que temos à mão, experimentar e fazermo-nos à vida, porque o momento perfeito não existe.”

4 “Qualquer que seja o problema, faz parte da solução”
Quando as coisas correrem mal, lembre-se desta máxima. Durante a viagem aconteceu-lhe quase tudo e escapou por pouco a situações bem apertadas. “No dia do meu 25.º aniversário estava trancado no meu hotel no Japão, porque lá fora estava a passar o maior tufão dos últimos 15 anos. No Chile, estava hospedado em casa de um português quando se deu um sismo de 6.8 na escala de Richter – o apartamento ficava no 20.º andar de um prédio que tremeu todo, mas não aconteceu nada, felizmente. Nos Estados Unidos, tive um acidente: ia a conduzir de Los Angeles para São Francisco e ao fim de seis horas de viagem o carro à minha frente parou bruscamente, dei dois piões na autoestrada, não me magoei, não atingi ninguém e o carro escapou inteiro. Quando estava em Moçambique, assaltaram a casa onde eu estava, na véspera de viajar para a Índia. Fiquei praticamente sem tudo o que tinha. No dia seguinte, 30 horas de viagem e a mala com o pouco que levava foi extraviada, fiquei com a roupa do corpo, literalmente. Não podia ligar para os meus pais e amigos porque não queria preocupá-los. Fiz uma campanha de donativos na Internet a partir de Deli, pedi aos patrocinadores e duas semanas depois consegui seguir viagem. Foi duro, mas tudo se resolveu.”

5 Rodeie-se de exemplos inspiradores e bons conselhos
Todo o propósito da viagem de André era recolher inspiração de gente que venceu, que se tornou um exemplo a seguir. Durante esse ano, alguns casos tocaram-lhe bem fundo. Um deles foi o do empresário português Ricardo Teixeira. “Para mim, é um super-homem. É tetraplégico, está à frente de três empresas em Portugal e uma no Reino Unido, é casado e tem um filho. Quando ele me disse ‘tenho todos os problemas que vocês têm e ainda as condicionantes físicas, mas se eu faço acontecer porque é que vocês não fazem?’ Esse caso provou-me que a capacidade de fazer acontecer está mais em nós do que nos outros.”

6 Aprenda a fazer um bom marketing pessoal
Foi nas ruas de Nova Deli que André conheceu ‘o Cristiano Ronaldo indiano’. Mas este não jogava à bola. O açoriano estava parado numa banca quando sentiu alguma coisa a entrar-lhe no ouvido, sobressaltando-o. Um rapaz mais ou menos da mesma idade diz-lhe, então: “Relaxa, meu amigo. Só quero limpar-te os ouvidos. Posso?” “Perguntou-me de onde eu era e disse-lhe que era português. ‘Para teres uma ideia, eu sou o Cristiano Ronaldo a limpar ouvidos. Sou o melhor limpador de ouvidos do mundo!’ Não me limpou os ouvidos, mas criou ali algum impacto. É um exemplo um bocado surreal, mas serve para mostrar que temos que saber transmitir alguma confiança, sem medo de assumir que somos bons naquilo que fazemos, mas sem criar falsas expectativas. Foi um caso que me marcou por se tratar de um empreendedorismo por necessidade extrema: ali, o que está em jogo é comer ou não ao fim do dia.”

7 Gere valor para a comunidade, não apenas para si
Alguns dos exemplos mais emocionantes deste livro são os empreendedores que trabalham em prol da sua comunidade. Como as avós indianas analfabetas que se tornaram dentistas e engenheiras na Universidade dos Pés Descalços, ou o rapaz tanzaniano de 10 anos que fez o primeiro sistema de luz elétrica na sua aldeia. “Mesmo quando temos uma empresa para faturar, não criamos valor só para nós: criamos postos de trabalho, algumas empresas têm pacotes de responsabilidade social que ajudam a comunidade. Isso também é um traço dos empreendedores”, observa André. “Conheci pessoas que criaram negócios que resolviam um problema social na sua comunidade, sobretudo em locais onde não existem sistemas de apoio. Pessoas de 50 e 60 anos que mudaram de vida e hoje estão a ajudar crianças.”
André também tem experiência no empreendedorismo social. Hoje, presta consultoria gratuita a pessoas que querem montar os seus micronegócios mas que não têm muitos meios. “Ajudo-os a passar as ideias a um plano de negócios, a montar estratégias de marketing e investimento. É o meu voluntariado, que concilio com os meus projetos profissionais.” Gostaria ainda de criar uma espécie de escola ‘Faz Acontecer’, “com formação sobre empreendedorismo”. E quer inspirar os mais novos. “Tenho dado muitas palestras em escolas e universidades e estou a tentar implementar um projeto com o Governo dos Açores, em que me proponho a ir a todas as escolas secundárias das ilhas falar da volta ao mundo e inspirar os miúdos a ‘fazerem acontecer’.”

O que aprendeu sobre ele próprio, nesta odisseia? “Comecei a dar mais valor aos momentos passados com os meus pais e as pessoas de quem gosto. E aprendi que o difícil é diferente de impossível e que eu só não faço o que não quero.”

Empreendedores pelo mundo: o que têm em comum?
Mais do que competências técnicas e cursos, as pessoas inspiradoras que se encontram em ‘Faça Acontecer’ têm características semelhantes, diz-nos André Leonardo.
• Sonham e não deixam os sonhos na gaveta.Traduzem-nos num plano ação para os pôr em prática.
• São altamente persistentes e resilientes. Perante as barreiras que aparecem não desistem; simplesmente adaptam o caminho e vão fazendo as coisas acontecer.
• São muito automotivados. Transformam os ‘nãos’ em energia positiva para seguirem em frente.
• Têm uma atitude muito proativa e resolvem os seus problemas. Não ficam à espera de soluções por parte de entidades, do estado, de outras pessoas. Se não souberem como se resolve, perguntam a quem sabe.
• Têm capacidade de sacrifício e abdicam de algumas coisas. Dar a volta ao mundo, para mim, implicou estar um ano longe da minha família, tempo durante o qual falei com os meus pais apenas três vezes, com calma e por Skype. Nada que nos traga valor se conquista sem sacrifícios envolvidos.

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