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Estar triste é mau, estar alegre é bom.  Ter raiva é mau, sentir amor é bom.Aprendemos desde cedo a classificar as emoções como crianças a brincar aos índios e cowboys: há os bons e os maus e ninguém quer ficar do lado dos vilões. Mas e se não houvesse emoções melhores que outras? E se nos garantissem que as ditas emoções más têm sido injustamente vilipendiadas, sem ver reconhecido o seu papel essencial na nossa vida? Mais: e se nos ensinassem a tirar partido da raiva, da tristeza, do ciúme, da inveja até? É ideia para revolucionar uma vida. Horácio Lopes, 46 anos, psicoterapeuta especializado em counselling, dá workshops de desenvolvimento pessoal para explicar isto mesmo: “As emoções não são boas nem más, são neutras. Não quer dizer que não sejam importantes, pelo contrário, é a afetividade que modula a nossa experiência do mundo. O que achamos que sabemos racionalmente é quase sempre uma crença emocional”, diz. 
O conhecido neurocientista português António Damásio ficou conhecido por defender o papel fundamental das emoções, demonstrando que não existem decisões puramente racionais, pelo menos não boas decisões. Razão e emoção são irmãs siamesas que vão juntas a todo o lado, e é assim que deve ser. No primeiro livro, o célebre ‘O Erro de Descartes (1994), Damásio explica que descobriu isto ao analisar pacientes com lesões em áreas do cérebro correspondentes às emoções. Estas pessoas conseguiam falar normalmente e até fazer cálculos matemáticos mas eram incapazes de tomar decisões tão simples como marcar um encontro para almoçar ou decidir entre comprar uma caneta preta ou azul. Isto acontecia porque o cérebro guarda na memória o conteúdo emocional das decisões que tomamos ao longo da vida. Sempre que precisamos de decidir novamente esse marcador reaparece, ajudando-nos a tomar uma boa decisão. Hoje, sabemos que a afirmação de Descartes, ‘Penso logo existo’, já não faz sentido. Mais certo será: ‘Penso, sinto, logo existo’.

Amor e ódio não são emoções 
É matéria confusa, mas emoções e sentimentos são coisas diferentes. “As emoções, como a alegria ou a raiva, têm uma dimensão física, estão ligadas a sensações do corpo, próximas do instinto. Os sentimentos, por sua vez, têm uma dimensão racional, implicam um processamento do significado do que se experimentou na emoção, é como se fossem a fase seguinte à emoção. Exemplos de sentimentos são o amor e o ódio. Diz-se dos sentimentos que têm menor intensidade e maior duração. As emoções têm maior intensidade mas são de curta duração”, explica Horácio Lopes. Esta é de resto uma das razões porque não vale a pena reprimir emoções: se as expressarmos passam rápido, se as tentarmos conter, irão encontrar  outra via de expressão. A boa notícia é que “muitas vezes tomar contacto com a respiração pode ser suficiente para uma emoção como a raiva passar sem fazermos grandes estragos”. 

‘A raiva é uma força de vida’
Podemos tentar não julgar as emoções como boas ou más, mas é difícil não as classificar, pelo menos como agradáveis ou desagradáveis. A raiva, por exemplo, não é emoção fácil de apreciar mas tem um papel essencial. O psicanalista norte-americano Alexander Lowen, pioneiro com Wilhem Reich da psicoterapia corporal nos anos 40, afirmava que ela ajuda a manter e a proteger a integridade física e psicológica do organismo e que sem ela ficamos impotentes face aos ataques a que a vida nos sujeita. Apesar disso, ela é uma das emoções mais reprimidas desde a infância. Para Lowen e outros autores da mesma linha, a raiva não expressa do passado pode ser a causa de muitas das tensões e rigidez. Expressar as emoções reprimidas no passado de forma segura permite-nos convertê-las em energia para agirmos na nossa vida. 
Horácio Lopes subscreve: “A raiva é uma das maiores forças de vida e pode ser integrada de forma construtiva. Se temos raiva porque nos sentimos limitados ou temos poucos amigos, essa emoção ajuda-nos a sair para o mundo e mudar o que não gostamos”, explica este psicoterapeuta, lembrando que não nos devemos afastar nunca do sentido positivo das emoções. “Todas sem exceção são úteis porque nos informam de forma rápida e direta de como nos sentimos relativamente a alguma coisa. O truque não é ignorá-las ou combatê- -las, mas apoiarmo-nos nelas.” E ter em mente que sentir uma emoção desagradável não faz de nós piores pessoas. Perante um acesso de raiva, podemos ter a tentação de dizer ‘fiquei possuída, não era eu’.  Mas “acharmos que as emoções não são nossas abre caminho à dissociação. O primeiro passo da integração é reconhecer que as emoções nos pertencem. O segundo é perceber que podemos manifestá-las adequadamente”. 

Boas ideias para canalizar a raiva:
– Mexa-se. Quando sentir a raiva invadi-la, vá para um sítio onde não a vejam, ponha as mãos nos ombros e gire os cotovelos para trás como se fosse uma galinha a bater as asas, abrindo bem o peito. Se correr, vá fazer uma corrida, ou meta-se uma tarde no ginásio a queimar calorias, a ideia é dispersar a adrenalina. Se não puder sair de onde está, aperte os pulsos prendendo a respiração e depois solte expirando tudo, várias vezes. Faça caretas, salte no lugar, encontre um sítio onde se sinta confortável a dançar à maluca e onde possa gritar (em último caso na almofada). Outras ideias: ir para a cozinha bater claras em castelo, amassar farinha para fazer pão, dar início às limpezas da primavera, mesmo que seja verão.

– Não entre em parafuso. Está numa reunião e o chefe ignora todas as suas ideias, o que a enfurece. O risco de dizer algo que não deve é grande. Respire fundo, expire no dobro do tempo que leva a inspirar. Perceba os batimentos cardíacos acelerados, os músculos tensos. Ao fazer isso é natural que a fúria se dissipe mais rapidamente. Mais tarde – idealmente no dia seguinte – pode pensar com mais clareza no que fazer.

– Faça tudo o que tem para fazer… melhor ainda. Alguns estudos mostraram que a raiva liberta adrenalina, o que significa que o coração e o cérebro recebem mais oxigénio e açúcar. Não desperdice o aporte de energia extra. Uma das funções da raiva é ajudar-nos a lutar pela nossa integridade. Não tem de explodir no momento mas meta-se a trabalhar, vai reparar que tem bastante mais energia, mais foco e mais atenção aos detalhes.
 
– Veja-se ao espelho. Uma coisa é sentir raiva perante uma injustiça, outra é ir aos arames por coisas irritantes que as pessoas fazem. Certo, há pessoas muito tolas e podemos deparar-nos com elas muitas vezes, mas se se aperceber que elas a irritam profundamente, a ponto de ter os sintomas físicos associados à raiva (batimentos cardíacos acelerados, por exemplo), talvez seja boa ideia refletir. Muitas vezes, o que mais nos irrita nos outros é o que não conseguimos reconhecer em nós.

– Controle a situação. A raiva não expressa pode gerar uma sensação de impotência devastadora. Acontece quando não temos controlo para mudar os acontecimentos. Exemplo: estamos com pressa e ficamos presos num engarrafamento. Não podendo fazer os carros andar ou ir na vassoura voadora, podemos assumir algum controlo, isto é, agir para pôr a energia em movimento, seja pegar num pano e limpar o carro por dentro ou usar o telefone para fazer aquelas chamadas que andavam pendentes há meses.Converta-a em desejo. 

– Converta-a em desejo. A raiva e o sexo têm o mesmo canal de expressão e por vezes exprimir a raiva pode abrir o caminho para o prazer. É o velho cliché, ‘discussão acesa agora, sexo ardente depois’.

 

Emoções primárias e secundárias:
Há 6 emoções primárias: tristeza, alegria, medo, raiva, dor, prazer. A partir destas surgem as secundárias, uma combinação de emoções primárias em dose variável. Estes são exemplos de possíveis combinações: 

Ciúme = raiva + medo + atração. 
Como usar positivamente? Fazer dele um motor de conquista no sentido
de nos autoaperfeiçoarmos.

Culpa = tristeza + dor + medo. 
Pode ser dirigida contra os outros (vitimização) ou contra nós mesmos. 
Como usar positivamente? Aprender a autorresponsabilizarmo-nos. 

Vergonha = tristeza + raiva + medo. 
Como usar positivamente? Buscar e cultivar o que percebemos como falta, usando a energia da raiva para perseverar na aprendizagem e no cultivo da autoestima.

Orgulho = alegria + raiva + medo. 
Como usar positivamente? Transmutar em serviço ao próximo essa qualidade
que enaltecemos em nós mesmos.

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