Quando tinha 15 anos, achava que aos 30 já teria a vida resolvida. Daquele jeito: casa própria, dois filhos, finanças equilibradas, uma viagem por ano e árvore de Natal. Fiz 29 há alguns dias e tenho oficialmente 12 meses para não decepcionar o meu eu adolescente. Mas parece-me que em certa medida todas as minhas amigas da mesma geração sofrem com a mesma frustração – não se encontraram na área profissional, ou não se sentem realizadas na vida pessoal, ou, mais comumente, não têm dinheiro para viver aquilo que sonham ou desejam.
Ser millennial podia parecer bastante promissor lá nos anos 2000, afinal éramos a geração do futuro! Mas entrar no mercado de trabalho bem no meio de uma crise económica mundial, que teve início em 2008 e arrastou-se por alguns anos de diferentes formas em cada país, foi um golpe forte no otimismo de muitos da minha geração. Depois de estudar para conquistar um diploma que já não é assim tão valorizado e preparar-se para assumir um posto de trabalho que já não existe mais naqueles moldes, foi preciso procurar emprego num momento de demissões em massa. Os primeiros anos de trabalho de um recém-formado da minha geração quase sempre resumiram-se a duas opções: estágios mal (ou não) pagos ou vagas totalmente não relacionadas à área de formação.
Quem casa quer casa
Os salários tão baixos não ajudam na independência, e ir morar sozinho vai ficando cada vez mais difícil. Na Europa, a idade média para deixar a casa dos pais ronda os 30 anos, de acordo com os dados da Eurostat de 2020. Considerando que atualmente pagar uma renda em Lisboa pode ser mais caro do que o próprio salário – um T2 pode custar entre 700 e 1000 euros mensais segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE); o casamento torna-se quase uma questão de economia.
Quando vim morar em Portugal, em 2017, só consegui resistir aos primeiros meses porque tive apoio financeiro dos meus pais e porque o meu agora marido veio comigo. Imigrar foi o único motivo para nós dois sairmos das casas das nossas famílias naquele momento. Tínhamos 27 anos quando nos casámos – e sim, queremos viver juntos para sempre – mas definitivamente nenhum de nós tinha acumulado o suficiente para ter condições de pagar sozinhos por uma vida fora do nosso país.
Tive a sorte de não passar um dia sequer desempregada. E digo sorte porque acreditar que o sucesso profissional vem unicamente do mérito é desvalorizar o trabalho de milhares de pessoas que não têm o reconhecimento que merecem pelo que fazem ou que ainda não chegaram onde gostariam simplesmente por não estarem no lugar e na hora certas. Conheço muitas pessoas que ainda não conseguiram encontrar uma vaga no mercado de trabalho e sei que não foi por falta de esforço e dedicação.
Vindos de uma década de muito estudo seguido de trabalhos precários, os millennials chegaram nos anos 2020 cheios de planos e sonhos adiados. E quando finalmente parece que podemos respirar de alívio com alguma estabilidade, a pandemia de covid-19 veio para colocar todos os sonhadores millennials nos seus lugares. Um em cada seis jovens perdeu o emprego durante a atual crise, segundo a Organização Internacional do Trabalho. E mais: o Fundo Monetário Internacional calcula que os desempregados na pandemia, quando voltarem a trabalhar, podem sofrer cortes salariais de 15%.
E um bebé, é para quando?
Desde que me mudei para Portugal que os meus amigos e familiares brasileiros fazem-me duas perguntas quando viajo para os visitar: “Vais viver lá para sempre?” e “Quando vão ter filhos?” Recentemente as minhas duas avós começaram a tricotar sapatinhos e roupinhas de bebés – e eu sou a neta mulher mais velha. Às vezes leio histórias horríveis sobre como vai ficando cada vez mais difícil engravidar à medida em que envelhecemos, que se juntam ao meu diabinho da ansiedade interior, e aí já estou eu a pensar como que vou comprar fraldas para o bebé se ainda preciso economizar na marca do detergente para roupa? Respira.
Em Portugal as mulheres têm o primeiro filho em média aos 30 anos, segundo o INE. Só 24% dos jovens abaixo dos 30 já têm casa própria, segundo um estudo da Fundação Calouste Gulbenkian. Parece-me que a minha ideia de que aos 30 teria a vida resolvida está bastante longe da realidade da maioria, o que me deixa bem mais calma. Afinal os 30 são os novos 20, certo? Tenho aquela ideia (bem fútil e ilusória) de que se uma pessoa tem tempo, dinheiro, dedicação e otimismo para decorar uma bela árvore de Natal, provavelmente é uma pessoa bem sucedida. Posso não ter marcado todas as caixas na lista de realizações, mas quem sabe no próximo Natal consigo brincar de jovem de 29 plena e realizada. Deve ser a crise dos 30 a bater à porta.