*Artigo publicado na revista ACTIVA nº 353 (abril de 2019)

‘Venha ter comigo cá a casa, tenho chá e bolinhos’. Quem é que consegue resistir a isto? Quando toquei à campainha, só sabia três coisas de Joana: que é fadista, que foi diretora da Prada em Portugal, que tem três filhos. Faltava o resto.

A promessa foi cumprida: bules japoneses, bolinhos caseiros, música zen. Ai eu assim não me consigo concentrar. É demasiada paz. E não estou habituada a ser tão bem tratada. Ela ri-se.

Que é uma mulher em busca de si própria, é óbvio. E ver-me envolvida na busca é como fazer parte de uma viagem. Acredita no destino, ou não fosse fadista. Mas as malhas do destino não costumam ser fáceis de deslindar. Enrola-se no sofá e começa a sua história, só que a partir de dentro. “Sou católica mas estudei hinduismo e tive de mudar muita coisa em mim. Nós não temos controlo nenhum sobre a vida. E isto, ou aprendemos suavemente ou a vida nos ensina à força.”

O ioga ajudou a essa reflexão. “Tinha tido o meu segundo filho e, como toda a gente, fui para o ginásio emagrecer. Mas quando lá cheguei, encontrei a professora de ioga e fui experimentar uma aula. Achei que aquilo era tudo seitas mas ela insistiu tanto que fui, e adorei.”

Começou a estudar a sério, até dar aulas no Solinca do Colombo e num ginásio nas Olaias. “Mas nessa altura já tinha a minha empresa e cantava fado, aos domingos e segundas, no Clube de Fado. E a vida começou a ser uma montanha russa.”

Não envergonhar ninguém

Sempre foi uma inquieta, mas talvez a inquietação se herde. É estranho falar nisto no ambiente mais sossegado onde já estive, mas é lógico que as pessoas inquietas precisam mais de paz.

Começámos logo a comer bolos e a conversar sobre ioga, mas tenho de recuperar o princípio (todas as histórias têm um princípio) para perceber de onde é que a Joana veio.

Nasceu em Lisboa, há 47 anos, descendente de António Sérgio (sim, o filósofo), numa família intelectualizada. O pai é engenheiro civil mas tem o curso superior de piano, tal como a avó, e a música fazia parte da família. “Todos tivemos que estudar música, era como aprender a ler”, ri Joana. “O meu pai tocava viola, o meu tio, guitarra portuguesa, e eu cantava.”

Continuamos a falar naquilo que se aprende com a família, principalmente com o pai, de quem ainda é muito próxima. “Foi presidente da Junta Autónoma das Estradas, administrador da Expo, teve altos cargos, mas tinha uma vertente artística que nunca perdeu, era um pensador, era músico, pintor, tinha uma banda com o meu tio. Há 11 anos teve um AVC e perdeu a fala. Mas ainda hoje vou com ele à tertúlia que mantém com amigos, e há um respeito enorme por ele que me comove.”

O lado B de uma família que nos estimula e nos adora: também pode pressionar-nos a vida toda para estarmos ao seu nível. “Quando lancei o meu primeiro CD, ‘Fluir’, o meu pai disse-me: ‘Faz uma coisa de que te orgulhes’. E há sempre aquela coisa de sermos herdeiros do António Sérgio. Tenho um respeito enorme pelo meu pai, passei o tempo todo a pensar se estaria à altura dele. Mas acho que não envergonhei ninguém. Ele dizia-me sempre: ‘Se fores lavar escadas, que sejas a melhor a lavar escadas’.”

Mas não foi. Lavar escadas. (risos) “Não, não fui. Comecei a cantar fado com 15 anos, na casa de fados do Nuno da Câmara Pereira. Lá fui cantar o ‘Cavalo Ruço’ com o Mário Pacheco na guitarra, que ficou sempre junto a mim como produtor até eu me desligar do Clube de Fado. E disseram-me: ‘Aprende mais dois fados e ficas cá a cantar. Aprende mais três e ficas cá às terças e quintas’. E eu fiquei, com a Teresa Tarouca, o Paulo Bragança, e o Mário Pacheco sempre a ajudar.”

Sem tempo para o medo

Sempre se cantou fado na família, portanto não foi uma grande surpresa que Joana se dedicasse a essa ‘herança’. Mas como leiga, presumo que seja diferente cantar para a família ou cantar para estranhos… Enfim, isso sou eu que não canto, não o furacão que é a Joana Pessoa. “Não tenho tempo para ter medo, porque eu atiro-me para tudo e só depois é que olho para trás”, ri-se. “Quando percebo que era mais complicado do que pensava, já passou. Em situações da minha empresa onde ninguém queria chegar-se à frente, eu ia. E com o fado foi a mesma coisa. Mas lembro-me da primeira noite. E como já cantava em casa, para amigos, não foi muito diferente.”

E a propósito, conheceu a Amália Rodrigues? “Sim, ainda cantei no Clube de Fado com a Amália lá. Não se dava muito connosco, não por ser diva mas porque já era mais velha. Nessa altura ainda havia ‘famílias’ no fado. Eu se cantava no Clube de Fado não ia cantar ao Senhor Vinho. E havia os fadistas mais velhos: o Alcino de Carvalho, a Maria de Nazaré, a Beatriz da Conceição. Nós, que éramos os novos, tínhamos de ouvir e calar. Era como na família. Mas ensinaram-nos muito do fado antigo. Se tivesse começado há dez anos, eu não cantava como canto hoje.”

A rainha do fado ia pelo mesmo caminho. “Lembro-me que uma vez disse qualquer coisa como ‘estão aqui estas gaiatas que ainda não perceberam o que é o fado’. Mas era uma pessoa alegre, desbocada. E isto que ela nos dizia diziam-nos todos, todos os dias.”

História dos Franciscos

Mas mesmo as fadistas têm de ter uma profissão, além de que Joana nunca foi mulher de um ofício só. “Eu queria trabalhar com crianças em situações de crise e fui para Relações Internacionais, para depois ser colocada numa Save the Children.”

Claro que aquele ditado que diz que a vida é o que acontece quando estamos ocupados a fazer planos também lhe aconteceu. Apaixonou-se, casou-se com 20 anos, e percebeu que a sua vida não ia ser a salvar crianças no outro lado do planeta. “Especializei-me em economia internacional e estava à espera de odiar tudo aquilo, mas, curiosamente, adorei.”

Três anos depois teve o seu filho, Francisco Maria. “Tenho 3 filhos mais 1. O Tiago tem 26, está na Escócia. O Francisco Maria tem 24, o Lourenço tem 20 e o Salvador tem 10.”

O Francisco chama-se assim por causa de uma promessa. “Eu acabei o curso com uma cadeira do primeiro ano, uma coisa sobre aviões e mísseis antibalísticos, um horror. Fiz 9 vezes exame, e temia que aquilo continuasse eternamente. E no último fui à oral com 8. Era o dia de S. Francisco, e eu prometi a S. Francisco que, se passasse, o meu primeiro filho se ia chamar Francisco.” (risos)

Pelos vistos funcionou… “E o mais engraçado é que depois acabei por casar na Igreja de S. Francisco, no Dia de S. Francisco, com um padrinho Francisco. Enfim, ainda bem que o exame não foi no Dia de S. Judas…” (risos)

E que história é aquela dos três filhos mais um? Quem é o um? “Isso é uma longa história.” Estendo a mão para mais um bolinho. Adoro longas histórias e tenho o resto da tarde livre.

O quarto filho

“Estava a trabalhar na Prada e era uma altura em que precisávamos de equipas de reforço, natal ou verão. Uma amiga conhecia bem a Casa do Gaiato e falou-me num rapaz para nos ajudar, o Tiago, tinha ele uns 18 anos. A Prada adorou-o e ele começou a trabalhar connosco. A certa altura comecei a notar que à sexta e ao sábado ele estava sempre muito cansado, e perguntei-lhe o que se passava. E explicou-me que o percurso que fazia para chegar à Prada era de loucos. Então, como eu tinha um quarto vago em casa, combinámos que ele ficaria comigo.”

A certa altura, o Tiago teve de deixar a Casa do Gaiato e acabou por ficar em casa da ‘Tia Joana’ porque na verdade já era da família. “O Tiago foi uma bênção. Ele tem-nos ensinado tanto.” Como o quê? O que se segue é um verdadeiro conto de natal: “Ele foi trabalhar para a Amazon na Escócia. Então nesse natal eu disse aos meus filhos: ‘O Tiago  vem cá passar o natal connosco, atenção aos presentes.’ E o Tiago chega com presentes espetaculares para toda a gente… e os meus filhos mais velhos não tinham qualquer presente para ele. Levaram uma lição de vida de que nunca mais se vão esquecer. Mas ouvir uma pessoa dizer ‘foi a primeira vez que senti o que era uma família’ foi muito comovente. O Tiago não tem ninguém, e nós nem valorizamos o que é ter uma família. Quando veio viver connosco, ele dizia: ‘Eu nunca comi numa mesa assim, eu nunca vi televisão assim, posso ir deitar o Salvador consigo? É que não sei como é que se deita uma criança…’ Tudo isto foi uma verdadeira lição de vida.”

Quando a fadista vestiu Prada

Voltemos ao fim do curso, com a Joana recém-mãe de dois filhos pequenos. “Eu queria ser mãe com tempo, mas também não queria ficar totalmente parada. Fiz investigação pedagógica na Faculdade de Ciências, trabalhei na Caixa Geral e no Banco Espírito Santo, montei a minha empresa…”

Como é que a Prada entrou na sua vida? “A diretora da Louis Vuitton em Portugal nessa altura, a Alda Salavisa, com quem já tinha trabalhado, recomendou-me à Prada. Eu já trabalhava para a Farrutx em Portugal, mas nessa altura  estava em casa com o meu filho mais novo, a gozar em pleno o ser mãe. Portanto, fui à entrevista na boa, nas calmas, não estava nada nervosa, sempre achei que nunca me iriam escolher. Depois chamaram-me para ir a Milão. E qual é o meu espanto quando me dizem que tinha sido escolhida…”

Lembra-se que a explicação que deram sobre si própria foi ‘She’s strong enough, she will be able to handle it’. E assim foi.

Revelou-se uma parceria de sucesso. Foi diretora e brand manager na Prada, e adorou. “Era muito giro, um ambiente com muita vida, muita alegria. Cheguei a ter uma equipa com 35 pessoas, e nem toda a gente é fácil. Muitas vezes o objetivo da empresa não é o objetivo da pessoa, e as duas entram em choque. Mas isto é um problema universal e ultrapassa-se. Entrei na Prada há 9 anos, saí há um ano e pouco. Foram muitos anos na empresa. Entrei quando abriu em Portugal, saí quando precisei de mudar de vida.”

Ser diretora da Prada em Portugal mudou a sua relação com a moda? “Completamente. Aprendi imenso. E também tinha de me preocupar com a imagem da marca. Mas sempre fui muito discreta, saias compridas, por aí.”

O que a perda ensina

Entretanto separou-se do pai do seu terceiro filho. Uma quebra duríssima, que mudou a sua vida de várias maneiras. “Foi uma separação muito dura, porque não foi um processo gradual, foi repentino: hoje já não ficas. Fui deixar os meus filhos mais velhos com o pai, o pequenino ficou comigo em casa de uma amiga.”

A bomba explodiu depois de uma discussão. “Estávamos a um mês de nos casarmos, eu já tinha vestido, alianças, estava tudo combinado. Mas percebi que não dava. Percebi no ashram a não me autoviolentar. Eu tenho de ser a minha melhor amiga. Eu é que tenho de estar no topo da minha pirâmide.”

Esforçou-se no trabalho para que ninguém sequer se apercebesse. “Chegava à Prada como se nada fosse e ninguém percebeu que eu me estava a separar. Só me questionaram quando eu meti férias para mudar de casa, e aí expliquei o que tinha acontecido. Fazer como se nada fosse às vezes é uma questão de sobrevivência. Mas fiquei muito grata à Prada, que me ajudou muito, em tudo.”

Também já se tinha separado do seu primeiro marido, mas aí foi pacífico. “Percebemos de repente que já não gostávamos um do outro, dividimos as coisas amigavelmente, foi uma paz. Hoje continuamos amigos e sei que estaremos sempre lá um para o outro.”

Um golpe mais duro se aproximava, e um golpe duplo. Imaginem o que é perder ao mesmo tempo a mãe e o melhor amigo. “Perdi a minha mãe e o meu melhor amigo em dois meses. Quando a minha mãe morreu, senti que perdi o chão. E ao mesmo tempo perdi o meu melhor amigo, que me protegia muitíssimo em tudo. Morreu atropelado e foi a primeira vez que me descontrolei na vida. Não sou nada de alimentar lutos, mas sei que ainda não consegui encontrar alguém que seja na minha vida o que aquelas duas pessoas eram.”

Perder o chão, recuperar a vida

O que é que acontece quando perdemos as nossas raízes? Perde-se o rumo. “Fiquei desnorteada”, recorda Joana. “E tentei encontrar o sentido de tudo aquilo. A morte é o apego, e nós temos de trabalhar o desapego. Acho que, naquela altura, a mensagem para a minha vida era: ‘a partir de agora, vais continuar sozinha. E tu é que vais ser essa raiz para os outros’.”

E decidiu deixar a Prada. “Nós perguntamos sempre porquê, mas temos de perguntar para quê. Acredito mesmo que há uma razão para tudo. Em linguagem cristã, eu tenho um destino a cumprir. E só tenho de estar grata por estar a fazê-lo. Às vezes perguntam-me, como é que foste deixar a Prada? Mas eu tinha muito mais para viver e para aprender!”

Teve consciência disso? “Claro que sim. Havia uma grande confusão na minha cabeça, porque senti que andava a viver a vida dos outros em vez de viver a minha. E quando sentimos que uma relação está a acabar, é andar para a frente. E valeu a pena. O meu pai sente-se muito mais apoiado, o meu filho está muito melhor, tenho mais disponibilidade para o fado, e a vida tem-me dado experiências que não teria podido viver de outra maneira.”

Uma das suas ‘missões’ foi dar mais apoio ao filho mais novo, Salvador, que sempre teve problemas de saúde muito complicados. “Depois de sair da Prada tive finalmente tempo para o acompanhar decentemente, para descobrir uma médica em Braga especialista em processamento auditivo, que é uma coisa pouco desenvolvida cá em Portugal.”

O Salvador tem vários problemas: défice de processamento auditivo (não faz a ligação dos sons ao córtex), défice de memória auditiva (ainda há pouco tempo não repetia dois números), falta de localização espacial e temporal (não sabe em que altura do ano está e aos dez anos não sabe os números nem as letras). “A médica recomendou o colégio de S. Tomás e ele é um privilegiado porque tem uma professora só para ele, e tem um ensino muito especializado. No colégio anterior sofreu mesmo bullying à séria: os outros miúdos davam-lhe pontapés, foi mesmo mau. Mas agora tudo isso mudou.”

O poder da música

Voltar para casa foi reaprender a viver, e foi também perceber o que verdadeiramente queria. “A lição mais importante foi que a vida não se compra. A minha mãe estava na Fundação Champalimaud e teve o privilégio de poder montar o hospital em casa e morrer em família. Mas por mais dinheiro que ela tivesse, não conseguiu comprar a vida. E no caminho para a morte já não interessa se a cama é confortável, mas se estamos pesados, se estamos leves, se há alguém a segurar a tua mão. Acredito que o nosso último dia é o dia mais importante da nossa vida. E aquilo que levamos connosco não se compra.”

Também a sua relação com o dinheiro mudou. “O dinheiro é para pagar as contas e para ter uma relação saudável com ele. Não serve para mais nada. Hoje em dia já não vou a restaurantes, não viajo, aquilo que quero é compor música e estar com as pessoas que amo. Temos que perceber qual é a nossa missão aqui.”

E a sua missão, qual é? “Uma delas é perceber qual é o meu lugar na música. Em maio sai um projeto que me deu imenso prazer, o CD ‘Camões’. Um dia dei com um soneto do Camões, escrevi uma melodia, mostrei ao meu produtor, que adorou, fiz 11 músicas para sonetos de Camões. A certa altura senti que era pobre ser só eu, e então escolhemos alguns temas e desafiámos o Fausto, o José Mário Branco e outros artistas. O Camões é tão intelectualizado, para que é que temos de estudar literatura para o entender? Não temos. Basta deixar-se levar pela música. Há pouco, um rapaz de 20 e poucos anos contou: ‘Acordei a pensar suicidar-me, ouvi a sua música ‘Quando a barca vier’ e desisti de me matar’. E a música tem esse poder. Se a minha música puder inspirar ou dar sentido à vida de alguém, isso faz-me muito feliz.”

Paixão por Portugal

Tem muitos outros projetos: um romance, um CD de fados tradicionais e letras suas, um de mantras em sânscrito, uma página de ioga, ‘namasté’. Mas o fado continua a ser ainda hoje o que lhe aquece a alma. E o seu sonho é trazer o presente das vidas de hoje para o passado do fado antigo. “Aquilo que eu sinto é que anda toda a gente a cantar o mesmo, tipo ‘foi para a Calçada de Carriche numa casa de pasto’ e tal (risos) mas isso é o passado, e a nossa geração tem de cantar o presente. Eu escrevo letras, quer para mim quer para outros cantores, onde a condição da mulher já não é aquela, a rua já não é viela, e ele já não passa na minha rua com ela porque eu já fui à minha vida. (risos) Portanto, essa cena do fado desgraçadinho já era. Já ninguém é desgraçadinha.”

O fado continua intenso, digo eu, mas já percebi que meti a pata na poça porque obviamente que o fado é intenso: então o fado é a vida!  “No outro dia perguntaram-me porque é que tu és tão intensa? E eu perguntei-lhe: mas tu já amaste alguém de verdade? É por isso que o fado é intenso, porque o fado é vida. Mas não acho nada que o povo português seja triste. Essa imagem que os portugueses querem passar parece que nos diminui, e nós somos fabulosos! Somos dos povos mais talentosos e trabalhadores do mundo. E a razão porque Portugal está na moda – e isto eu aprendi na indústria do luxo – é que o verdadeiro luxo é aquilo que é genuíno. Nós tivemos a sorte de ser pobres: houve muita coisa que não se estragou. Ainda mantivemos muita coisa intacta, as tascas, as igrejas, os elétricos. E temos a sorte e o privilégio de ter o fado: e não vale a pena o espanhol vir cantar fado, o chinês vir cantar fado. Porque falta a centelha de que fala o Camões. E ou se nasce com aquilo ou não.”

E depois, claro que há quem seja desgraçado… “Mas felizmente que a maioria não é. Acredito que se cantarmos coisas negativas atraímos coisas negativas para a nossa vida. E há tantas formas diferentes de cantar fado! Eu quero a essência do fado, quero cantar o fado tradicional, mas quero pôr a nossa realidade lá dentro. Porque eu não vou continuar a cantar a ‘Casa da Mariquinhas’, não vou continuar a cantar o que aconteceu há 100 anos! E, por exemplo, porque é que no Porto se canta fado de Lisboa? Porque é que se fala nas chinelas da Mouraria? Então não há umas chinelas na Ribeira? Façam o vosso fado! Tornem-no vosso! Têm a história do vinho do Porto toda para contar, por exemplo. A vossa história não são as chinelas da Mouraria…” (risos)

O xaile, a saia e a vida

Hoje dá apoio ao pai e aos filhos, trabalha em todos os seus projetos, escreve um romance, faz ioga e continua a cantar, na casa de fado ‘Senhora do Livramento’. Ela própria também tem uma imagem ‘muito portuguesa’… ou talvez não. “Por exemplo, uso sempre xaile. Mas não é por ser tradicional. Dizem que já ninguém canta de xaile. Mas um dia, eu devia ter uns 20 anos, a Beatriz da Conceição disse que me ia arranjar um xaile e eu pensei ‘sou finalmente fadista’. Foi como ser reconhecida, aceite, membro do clube. É um símbolo e tem uma função: prende a mão. Há uma linguagem gestual ligada ao xaile. Portanto, canto de xaile e canto de preto, porque o preto é chique e low-profile, e eu gosto disso.”

De qualquer maneira, há toques pessoais e intransmissíveis: “Adoro vestir coletes minhotos ao contrário. Até já me ligaram a perguntar se eram Prada (risos).” Mas hoje em dia, na era do despojamento, já não compra roupa. “Reciclo imenso e sou muito criativa. Antes das Pradas ia buscar muitas peças para as atuações e tinha uma costureira de teatro. Desenhava e mandava fazer, ou comprava dois vestidos para fazer um top, modificava muito. Um casaco não tem de ser usado pela frente, uma saia pode ser uma capa.”

E uma vida também não tem de ser um emprego das 9 às 6, e um filho também não tem de ser nosso, e um fado também não tem de ser da Mouraria… Fico a pensar em como isto tudo faz sentido, enquanto abro a porta para o mundo lá fora e me preparo para me desconcentrar outra vez.

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