Luísa é dona de uma energia e boa disposição inabaláveis. Aos 62 anos é mais um exemplo de como o empreendedorismo não tem idade e que se esta nos dá alguma coisa é sabedoria e conhecimento. Mãe de dois grandes músicos portugueses – Luísa e Salvador Sobral -, depois de uns tempos de pausa e dedicada à saúde do filho, Luísa iniciou o projeto inédito de experiências gastronómicas ‘Mesa Luísa’ em 2018. Depois vieram o programa de televisão e um livro de receitas com o mesmo nome mas diferentes na sua essência. Leia a nossa entrevista para saber mais sobre Luisa Villar.

Conte-nos um pouco da sua infância?
Nasci em Setúbal em 1960, vivi até aos 10 anos no Pinhal Novo e sou a quarta de 6 irmãos. O meu pai era corredor de automóveis e a minha mãe era dona de casa mas como ficou viúva muito jovem – o meu pai faleceu em consequência de um acidente muito grave em Angola – teve de se desembaraçar e começou a trabalhar naquilo que a maioria das mulheres sabiam na altura que era cozinhar. Depois da morte do meu pai viemos para Lisboa, para casa da minha avó materna e a minha mãe cozinhava para fora, em jantares em casa de amigas, casamentos… Passados uns anos, abriu um dos primeiros take aways de Lisboa que era o ‘Coma ou Leve’ em Alvalade. E pronto, eu nasci um bocadinho no meio das panelas.

Foi aí que despertou para a cozinha?
Sim, embora a cozinha sempre tivesse feito parte da nossa vida. A minha avó cozinhava muito bem e a minha mãe cozinhava por profissão, e era normal nós darmos uma ajuda. A cozinha fazia parte do nosso dia a dia, como falar ou andar. Quando, mais tarde, conseguiu alugar uma casa para nós, como ela saia muito cedo para trabalhar eu fazia o almoço para os meus irmãos e eles faziam as outras tarefas domésticas.

Mas não seguiu uma profissão ligada à cozinha?
Não, tirei o curso de intérpretação simultânea em Bruxelas e foi isso que eu fiz no princípio da minha vida, depois quando os meus dois filhos nasceram deixei de o fazer porque tinha de viajar muito e era complicado. Naquela altura os pais não ficavam sozinhos com os filhos (risos). Depois fui professora de francês seis anos e mais tarde fui parar por mero acaso à publicidade. Mas nunca pensei em seguir nada ligado à cozinha porque só quando estava a estudar na Bélgica é que percebi que era uma arte que se podia aprender muita coisa e aí sim comecei a comprar muitos livros.

Quais são as suas memórias mais antigas ligadas à cozinha?
São em casa da minha avó, lembro-me que eu fazia uns pãezinhos com chouriço antes de ir para a escola. Levantava-me mais cedo para fazer os pãezinhos para a minha mãe vender nas lojas e era essa a minha semanada. Até tinha um caderno onde fazia as contas aos ingredientes e ela depois pagava-me. Lembro-me que, como levava meia hora a levedar, eu acordava, fazia a massa, deixava a levadar, depois ia vestir-me tomar o pequeno almoço e a seguir fazia as bolinhas e deixava-as no forno e ia para a escola. A minha mãe é que as tirava. Devia ter uns 10-11 anos.

Sempre foi muito desembaraçada…
Foi algo que a minha mãe nos incutiu a todos quando o meu pai faleceu. Ela teve de o ser e fez isso também connosco. Por exemplo, para comprar roupa nós tínhamos de trabalhar, os meus irmãos faziam a apanha do tomate, e eu baby sitting. Lembro que tinha uns 13 anos e queria comprar umas calças de ganga da loja Maçã da Ana Salazar. Custavam 500$, para a minha mãe era impensável gastar aquele dinheiro por isso fui tomar conta de umas crianças alemãs em Cascais. Até cozinhar e lavar roupa fiz. No final do mês pagaram-me 500$ e eu fui direitinha à loja e gastei o salário todo nas calças.

Fez sempre o seu percurso profissional em Portugal?
Sim, embora os 3 últimos anos que eu tive em comunicação e marketing na Havas, como era responsável internacional, estava sempre a viajar.

E nas suas viagens, como eram as suas refeições?
A primeira coisa que eu faço quando chego a um país é ir a um supermercado. Adoro ir a supermercados, adoro ver o que eles comem, o que cozinham, como cozinham, que ingredientes usam, e isso foi uma aprendizagem muito rica porque ia aos restaurantes e e chamava o empregado, perguntava como era feito e como comiam…Uso muito do que aprendi lá fora..

Há algum país que goste tanto da gastronomia como da portuguesa?
Acho que a Bélgica é o país onde se come melhor. Embora tenha estado há pouco tempo com um grupo de belgas no meu espaço e eles disseram que já não é assim. A maravilha da Bélgica é que em qualquer café comia-se maravilhosamente. Quando vivi lá, havia um café em frente a minha casa que tinha um steak au poivre maravilhoso. Depois há a Itália, claro, é consensual, é tudo muito bom. A única gastronomia que provei e não gostei foi a chinesa. Estive na China a trabalhar e vi-me aflita, não gosto de quase nada.

Foi esse o seu maior desafio gastronómico?
Sem dúvida, o que era muito chato, porque as pessoas querem sempre receber o colega novo e eu via-me aflita para comer. Não queria ser mal educada e dizer que não gostava daquilo, e estava a beira do vómito. Tentava escolher comer porco agridoce, mas quando vinham com os fritos que não percebia o que lá estava dentro era aflitivo. (risos)

E qual a maior surpresa gastronómica?
A Argentina, é tudo maravilhoso.Têm o bom da América Latina e o bom da Europa. E são pessoas incríveis, super criativos, muito simpáticos, têm uma carne maravilhosa, um país lindíssimo.

Os seus filhos também gostam de cozinhar?
Sim, a Luísa é vegetariana, por isso ainda tem de ser mais criativa, mas o Salvador come de tudo, ainda há dois dias me ligou para saber qualquer coisa sobre risoto. Ele liga-me muitas vezes a dizer ‘se tivesses isto e isto e isto no frigorífico, o que fazias?”, (risos). Gosta muito de cozinhar e tem muito jeito.

Quando começou o projeto Mesa Luisa?
Depois do meu percurso profissional, despedi-me e tive uns anos arredada, também por questões de saúde do meu filho. Quando tudo voltou ao normal, resolvi que não estava na altura de encostar à box aos 50 e tal anos e comecei a pensar no que iria fazer. Eu tinha um espaço lindíssimo ao pé do Mercado da Ribeira que era o meu escritório, e eu e os meus filhos pensámos que seria muito giro fazer um projeto de experiências gastronómicas, algo que tínhamos feito algumas vezes lá fora. Como gosto de cozinhar, conversar e falo 4 línguas achamos que seria boa ideia. Ainda por cima coincidiu a Eurovisão vir a Lisboa, por que a Luísa e o Salvador tinham ganho em 2017, pedi-lhes para me ajudarem a promover. Em maio de 2018 tinha as obras da cozinha acabadas e eles fizeram um video nas redes sociais dizendo que cantavam bem porque eu cozinhava muito bem e foi assim que nasceu o Mesa Luisa e eu tive os primeiros clientes. Depois disso as coisas foram mais fáceis, porque as pessoas vão falando, fazendo reviews… Foi num crescendo até ao início de 2020. Nessa altura, tinha reservas até dezembro, estava a correr lindamente mas veio a pandemia e tivemos de cancelar tudo. Agora estamos a recuperar.

E no que consiste esta uma experiência?
As pessoas fazem a reserva online em mesaluisa.com e depois no dia escolhido, encontro-me com elas às 10h30 à porta do Mercado da Ribeira. Tomamos um café, explico quais são os nossos hábitos alimentares, o que comemos e não comemos, que somos o país da Europa que mais consome peixe e arroz, como cozinhamos… Depois vou damos uma volta no Mercado e são eles que me dizem o que querem cozinhar e como… Não há ementa pré definida, já tive grupos em que cozinhei 5 coisas diferentes. Compramos tudo o que é preciso e depois vamos para o meu espaço e cozinhamos todos juntos, come-se, bebe-se e conversa-se. As pessoas adoram porque é como ir a casa de alguém desse país.

O que comem com mais frequência?
Só tive dois casos em que não quiseram comer peixe, quase todos querem filetes ou peixe assado no forno… muitos nunca viram um peixe inteiro. Sopa também pedem muito para fazer.

Quem mais faz reservas?
Cerca de 95% dos meus clientes são americanos e muitos canadianos também.

A pandemia teve um grande impacto?
Enormíssimo, e ainda não recuperámos mas não me posso queixar. Estava em casa fechada e pus-me a ver livros de cozinha antigos, a pensar no que ia fazer à minha vida quando pensei que seria giro e diferente um programa de culinária na televisão baseado em livros de cozinha portugueses antigos. Enviei a ideia para os 3 canais e a SIC Mulher respondeu-me que sim e assim surgiu o Mesa Luisa que já vai em duas temporadas e espero que venha uma 3.ª.

Quem gostaria de levar ao seu programa?
O Herman, adorava, adora cozinhar e é um ótimo conversador. Achava graça ter o presidente Marcelo, já vai a tanto lado bem que podia ir almoçar e cozinhar comigo (risos), e o Ricardo Araújo Pereira e o Bruno Nogueira.

Como surgiu o convite para fazer o seu livro de receitas?
Em 2021 ligou-me a Leya a dizer que gostaria de fazer um livro com as receitas do programa mas como as receitas do programa já eram de um livro não fazia sentido e eu pensei noutro conceito. Quando estava a ler estes livros antigos, imaginava como seriam as mulheres que estavam por trás do livro e quem os lia. E a minha ideia foi essa, criar 20 mulheres de idades e estratos sociais diferentes que poderiam utilizar aqueles livros, escrevo um pouco da história delas e porque estão a fazer aquela refeição e depois dou as receitas. E depois escolhi os recortes de época e pedi a uma ilustradora que fizesse os retratos das diferentes mulheres.

E teve de arranjar pratos, talheres, copos para cada menu…
Sim, isso foi outra aventura, tive de procurar 20 conjuntos diferentes, conforme o estrato social e a história da minha heroína. A sessão fotográfica foi incrível porque a food stylist Bárbara tomaz conseguiu maravilhas, os pratos daquela época não são sexy, é tudo muita comida de tacho, mas ficou tudo lindo.

Que livros são essenciais para si?
O livro da Isalita e o da Maria de Lurdes Modesto, que já é uma profissional atual, já tem as medidas, as temperaturas, sempre que tenho dúvidas vou ao livro dela. Explica tudo muito bem. E depois tenho o Larousse de la Cuisine, claro, que é um tijolo pesadíssimo que eu consulto muitas vezes.

Qual é o prato que não resiste?
Ui há tantos, se fosse só um estava um bocadinho mais magra (risos). Continuo a achar que são panados com esparguete (risos), acha normal?

Prefere cozinhar doces ou salgados?
Salgados sem dúvida. As 20 receitas de doces do livro foram suadas, são muito simples mas muito boas. Agora estou melhor, faço grandes experiências em casa. Mas se eu fizer um prato que, por qualquer razão, não corre bem, consigo emendar, e no fim fica bem. No doce não, se começa a dar para o torto não sei o que faço. Choro! (risos). Tem de se respeitar à grama, não dá para inventar.

Se o seu menu fosse incluído no livro como seria?
Eu pus lá no livro, são os panados da Michele, são panados recheados com creme de queijo. Façam que é muito bom!!

O livro de Luísa Villar lançado no final de 2021

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